• Nelson Niero Neto, com Vinicius Galera
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Imigrantes europeus posando para fotografia no pátio central da Hospedaria dos Imigrantes, São Paulo, no final do século XIX (Foto: Guilherme Gaensly/Fundação Patrimônio da Energia de São Paulo/Memorial do Imigrante)

Imigrantes europeus posando para fotografia no pátio central da Hospedaria dos Imigrantes, São Paulo, no final do século XIX (Foto: Guilherme Gaensly/Fundação Patrimônio da Energia de São Paulo/Memorial do Imigrante)

O Brasil é o país com o maior número de descendentes de italianos do mundo. Segundo a Fondazione Migrantes, que organiza o Rapporto Italiani nel Mondo, são cerca de 30 milhões de brasileiros. O número corresponde à metade do total das pessoas com ascendência italiana do mundo — excluídos os nascidos em solo italiano, evidentemente. No dia 21 de fevereiro, é celebrada aqui a memória dos que saíram da Itália para tentar uma vida melhor no Brasil. É o Dia do Imigrante Italiano.

Em meados do século XIX e início do XX, o Brasil recebeu um fluxo enorme de italianos. O processo começou entre 1850 e 1860, segundo Rita do Val, coordenadora do curso de Relações Internacionais da Faculdade Santa Marcelina, onde mantém uma linha de pesquisa sobre migrações e refúgios. A população italiana, nesse período, estava arrasada. O processo de unificação do país não foi pacífico. Foram guerras, conflitos e revoltas que assolaram a região onde hoje é a Itália — e onde antes havia diversos reinos independentes.

Além disso, o país começava a passar por um processo de industrialização, mas não havia emprego para todos que saíam dos campos em direção às cidades. Nos campos, a situação não estava melhor. O governo do recém unificado território não tinha condições para subsidiar ou coordenar a produção agrícola. A população italiana passava fome em um país pobre e marcado por conflitos.

Países do outro lado do Atlântico, como o Brasil e os Estados Unidos, passaram a ser vistos como opções para fugir da pobreza e buscar oportunidades. No caso do Brasil, algumas características transformaram o país em polo de atração para os italianos.

Brasil no século XIX

Em meados de 1850, o Brasil começava a dar os primeiros passos para abolir a escravidão, processo que só terminaria em 1888. A Lei Eusébio de Queirós, aprovada em 1850 sob pressão do Reino Unido, proibia a entrada de escravos em território nacional. Sua eficácia a curto prazo é questionada, mas nas décadas seguintes outras leis foram aprovadas e, gradualmente, sufocaram o modelo escravista no país. As fazendas do Sudeste, com destaque para São Paulo e Minas Gerais, logo começaram a sentir a escassez de mão de obra para trabalhar nas lavouras de café.

“Não havia, de fato, essa escassez, já que a população de negros recém-libertos era numerosa, mas havia um desejo do governo brasileiro de embranquecer a população do país”, afirma Rita. Esse pensamento foi influenciado pelo movimento eugenista, que surgiu na Europa e defendia a superioridade do homem branco em relação aos asiáticos, indígenas e negros. “No Brasil, somava-se a esse pensamento um reflexo das centenas de anos de escravidão: entre assalariar aquele que havia sido seu escravo até outro dia e pagar por um imigrante europeu, os fazendeiros brasileiros escolheram a segunda opção.”

E o apoio do governo nesse sentido era forte: havia escritórios brasileiros na Itália que faziam propaganda do Brasil como uma terra de oportunidades. “Os pequenos agricultores vinham com a ideia de que aqui as terras eram baratas, vastas e férteis”, explica Rita. O Brasil também oferecia subsídios para a mudança, como o pagamento do custo da viagem, para incentivar a população italiana. “Foi, de fato, uma campanha migratória do governo brasileiro”.

Mão de obra italiana

A imigração italiana no Brasil teve duas fases. Na primeira, famílias inteiras vieram para trabalhar no campo. Em São Paulo, Minas Gerais e Paraná, o café estava em franca expansão na segunda metade do século XIX e era a principal atividade econômica do Brasil.  No sul do país, os italianos se dedicaram à produção de uva e de vinho, atividades a que já estavam familiarizados. “Diferente do café, que já era um produto consolidado no Brasil, a cultura de uva no Sul do país foi introduzida pelos italianos, que trouxeram o conhecimento do cultivo e as tecnologias de sua terra natal”, explica Rita.

Em um segundo momento, no início do século XX, o interesse do governo brasileiro em trazer famílias inteiras diminuiu. Indivíduos passaram a vir, sozinhos, para suprir a demanda das fábricas paulistanas. É a segunda fase da imigração italiana no Brasil, que influenciou a maneira de pensar e de se organizar da mão de obra urbana.

O fluxo de imigração seguiu intenso até a década de 1920, aproximadamente. Fatores diversos, como a eclosão da 1ª Guerra Mundial e o excesso de mão de obra no Brasil, diminuíram o interesse do governo em atrair imigrantes. Na Itália, o processo de saída do país também passou a ser controlado pelo governo, o que dificultou a imigração. As influências da cultura italiana e os costumes desse povo, entretanto, permaneceram como uma das marcas da sociedade brasileira.

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